terça-feira, maio 17, 2011

"Megabitaytes"



No dias que têm passado, o mundo da Enfermagem tem sido pródigo em acontecimentos. Positivos, negativos e inclassificáveis (enquanto aguardam por uma definição). Há, também, uns quantos hermafroditas, embora escassos, a quem reservo o direito de excepção e ficam por aí perdidos no nosso cosmos, a repousar. 
Vamos por pontos, breves:

1 - Vi, há uns dias, na a passar num canal de televisão (SIC, sem garantir) uma reportagem sobre a assistência aos peregrinos de Fátima. Foi dado o enfoque ao substrato dos cuidados - "fundamentais" - dos... Podologistas. Nem mais. 
Uns quantos alunos da fábrica da CESPU prestavam "cuidados podológicos" (no tempo dos Sumérios, denominados como "de Enfermagem"), enquanto que uma Associação representativa da classe fundamentava a sua premência e necessidade. Isto é um aviso, com a interpretação que todos sabemos.
Há quem acredite no destino, em profecias, em serendipity, sinais divinos ou outros. Eu acredito numa estratégia coerente de reconhecimento da nossa profissão, através da revalorização substancial dos nossos cuidados - solidificação dos conhecimentos, upgrade funcional e um establishment de competências, reconhecidas e escalonadas de acordo com o grau de diferenciação do Enfermeiro.
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Uns quantos colegas (muitos, demais até) perderam o sentido posicional da Enfermagem. Ainda que regida por diversos modelos conceptuais, assente em quadros teóricos e correntes filosóficas (ou como queiram designar), que servem como húmus de um universo (que se esperava expandir), a Enfermagem é um profissão! 
Por muito que custe a admitir a alguns bondosos e adeptos do amor incondicional e carícias metafísicas, a Enfermagem é um nicho no amplo mercado de trabalho, competitivo, agreste, no qual os seus membros são, supostamente, retribuídos monetariamente (regra geral)  pela prestação teórica e técnica (num espectro que viaja do psicossocial aos hi-tech procedures, com muita densidade no segmento que intermedeia este dois pontos) de cuidados básicos, intermédios ou diferenciados de cuidados de Enfermagem. Isto para dizer que, ao invés de subtrair de forma rígida e inflexível, qualquer possibilidade eventual de escalada evolutiva é um erro estratégico. Recusar o actual status do mercado da saúde, faz, indubitavelmente, com que a Enfermagem perca terreno para outras figuras, emergentes e parasitárias em hospedeiros complacentes.

2 - "O Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Enfermeiros [Enf. Manuel Oliveira] manifestou hoje [12 de Maio] perplexidade, em Coimbra, com o "crescente sentimento de desvalorização" do papel destes profissionais na gestão e contributo para os ganhos em saúde". link

Em pleno ano de 2011, séc. XXI, era moderna, o Enf. Manuel Oliveira manifesta "perplexidade" com o crescimento sentimentos de desvalorização! Fiquei atónito... e com dúvidas! A "perplexidade" é só perante o sentimento de desvalorização ou perante a desvalorização em concreto (materializada)?
Distraída (eufesmismo) com anos, anos e anos de Ética, a OE parece estar agora a assimilar e compreender factos que se têm consubstanciado na última década.
Aliás, não me compreendam mal: não é só a Ética. É um conjunto de iniciativas fechadas, auto-reflexivas, cegas e umbilicadas. A Enfermagem tem pensado para si e deixa de parte o mundo exterior, que nem tão pouco sabe o que os Enfermeiros fazem (a não ser que de uma forma ou outra já tenham necessitado dos respectivos cuidados) ou podem fazer.
Os resultados são por demais visíveis e trágicos. Depois de discussões intemporais, de dissecar casa asa de cada mosca, isto numa pormenorização de mosca-por-mosca, a matéria palpável que resultou de tudo isto é... zero. Por outras palavras (para os mais desentendidos), o sumo é nulo.
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Foi Ética até desfalecer. O que aconteceu? Os Enfermeiros têm voz decisória nos verdadeiros processos de tomada de decisão? Salvo excepções excepcionais, entretêm-se  a debater decisões de outras classes, ou pelo menos que outras classes fazem impor, como se de Enfermagem se tratassem. Opinar não paga imposto - e ainda bem! - tendo em conta que é aqui onde os Enfermeiros ainda se sentem com alguma autonomia em debitar palavras em palanques, porque no âmbito institucional a coisa é mais complicada e reservada a outras cabeças. Toma banho/não toma banho, é o dilema máximo que parece reservado e condicionado Enfermeiros.
Não posso terminar esta posta, sem me referir (mais outro exemplo) às paradoxais formações tipo rabbit-hole. Designo assim aquelas que partilham a abrangância de dois mundos: um imaginário, outro bem real. 
Há uma instituição onde esse fenómenos é flagrante (haverá outras, concordo): INEM. Enfermeiros com um nível de domínio científico e técnico notável, reconhecidos pelo respectivo profissionalismo e integridade, leccionam várias áreas de conhecimento a outras classes, como por exemplo Médicos (nada de novo, apesar de serem sinais dos tempos de informação livre e disponível para todos). Pensemos agora profundamente na situação: contextualmente, em sala de formação, o Enfermeiro ensina, relembra, explica e demonstra. O Médico aprende. O formador e o aprendiz. 
Poucas horas depois, já em contexto prático, a situação inverte-se. Aos olhos da lei e do povo, os Médicos pensam e prescrevem, os Enfermeiros executam e administram. Ainda há uns minutos os Enfermeiros explicavam, agora já estão a receber "indicações"?
Ainda bem que nós sabemos que não é assim. É tudo mais bem partilhado e as competências de cada um rentabilizadas. 
Quem passou pelos hospitais americanos há 30 anos atrás, ouvia como som de fundo: "Doctors prescribe, Nurses provide". Lavaram-se assim alguns cérebros. 
Engineers prescribe, Architects provide? Ou Architects prescribe, Engineers provide? Bem me parecia, mas algumas mentes continuam fechadas. Contra-argumentam... "a Florence disse isto, a Phaneuf aquilo...". Bom, a primeira já faleceu e a segunda é um amor.


3 - A OE criou um e-mail para receber queixas dos cidadãos relativamente ao acesso aos cuidados de saúde. 
Decifro no acto uma tentativa de estabelecer cumplicidade entre a classe e o cidadão na mesma linha de grandeza dos rastreios da tensão arterial, diabetes e colesterol. A OE torna-se assim semi-entrepreneur? Nem em casa cozinha, agora quer servir comida para fora? Depois indigam-se que se ouve o always-new-cliché "a Ordem não faz nada". Pois não, na Gago Coutinho não se passa mesmo nada.


4 - Os Enfermeiros não se entendem. Não atingem consensos. Não existe uma linha  que congregue opiniões de uma forma homogénea (embora com moderação, de preferência). Nem nos entendemos relativamente ao conceito de Enfermeiro ou funções de Enfermagem, porque haveríamos nós de nos entender no que concerne a matérias complexas?
Mas quando não nos definimos, há sempre um guru, que nos apelida de "doutores de papelão", enquanto dá a entender que a Enfermagem é um profissão do top ten, para a próxima década. Relativamente ao top ten, não terei dúvidas...
Mas a Enfermagem não é classificada assim por este guru. É uma classificação made in EUA,  que a rotula como a profissão mais promissora da próxima década.
Voltando a este guru ignorante, o mesmo acha que uma profissão com boas perspectivas será a de "Consultor Hospitalar". Logo a seguir afirma que é uma ocupação substituível por robots, ao contrário dos Enfermeiros!! A estupidez existe e não tem limites.




5 -O mural do Facebook do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses está ao rubro. Está anunciada uma greve geral na calhar se o Governo não ceder! 
A novidade foi publicada há uns dias e fez-me levantar da cadeira para ir buscar os óculos. A notícia é do jornal Público já tem um ano de idade e o SEP publicou agora no mural. Julgo que será para soprar um velinha - em jeito de comemoração - ao falhanço desastroso das negociações.O SEP anda desvairado e o homem do cadáver desaparecido.

Comments:
Não se admirem do desvairado comportamento, está a acabar a mama, o PS vai embora e quero ver quem os vai escudar...é que o PCP não tem voto a legislar...
 
Os enfermeiros em Fatima deveriam estar a fazer registo na CIPE ninguem os viu não foi focado o trabalho dos enfermeiros , eu sei que foram muitos da minha instituição que lá estiveram e que apoiaram os peregrinos não tenho duvidas, mas os meios de comunicação deram visibilidade ao podologista paciencia...para o ano será melhor é bom não esquecer de que a CESPU faz muita publicidade a este curso.flor
 
puto de post.
gostei!
 
Eu adoro este posts. Tem lá tudo. A ordem lê isto? Se não, devia.
 
Enfermagem está no topten das profissões mais promissoras da próxima década???Não deve ser em Portugal de certeza.Para mim, enfermagem já não é a minha profissão, é a minha expiação. Concordo com o anónimo das 6:44. É uma pena a OE não passar os olhos por este blog.
 
"Contra-argumentam... "a Florence disse isto, a Phaneuf aquilo...". Bom, a primeira já faleceu e a segunda é um amor."

GENIAL!! Love is in the air.....
 
Excelente post!
 
A Enfermagem tem esta particularidade: é uma profissão (é?...) que não sabe porque é que o é (se é que é!!!).

Muitos enfermeiros nem no hospital cuidam dos pés dos diabéticos e iam agora fazê-lo a caminho de Fátima? Tenham paciência!

E também não é o DE que é contra os enfermeiros mexerem nos pés e assim? É preciso ter um curso superior para tratar umas bolhas e uns inchaços?
 
Enviei um mail para a ordem com este post!
 
Deixem que lembre que uma entrevistada num direto, foi uma enfermeira do hospital de santarem, enquanto cuidava dos pés com flictenas, de uj peregrino. Certo é que essa enfermeira foi identificada como "voluntária" da cruz vermelha. Isto é, há muitos enfermeiros envolvidos no apoio aos peregrinos, falta-nos MARKETING...
Onde estão as Escolas de Enfermagem e as assocoações de enfermagem...?
 
Este post diz TUDO...
 
Excelente post carissimo...
 
O senhor Enfermeiro Manuel Oliveira disse manifestou perplexidade!? A OE deve habitar noutra realidade...
 
Para todos os críticos, teóricos e interessados, deixo este exercício: Experimentem saber e quantificar economicamente o real valor de todo o trabalho efectuado por si, enquanto Enfermeiro, e que a sociedade reconheça e ache justo pagar.
Rápidamente vamos perceber várias coisas, ou melhor, vamos perceber porque existem estas discussões inúteis nos blogs, porque estão os sindicatos num beco sem saída, o mesmo se aplica à OE.
Numa economia de mercado tudo tem de ter um preço.
Temos primeiro de resolver esta questão, ou estamos condenados a ser utilizados de borla.
Este é um grande negócio para o SNS, ou seja pessoal qualificado a preço da uva mij....
Claro que não nos querem nos órgãos decisórios; claro que não querem mudar o sistema de financiamento do SNS.
É urgente exigirmos saber quanto paga o estado pelo tratamento de um AVC e qual a parte que corresponde ao Enfermeiro. Só quando soubermos isto poderemos falar de igual para igual seja com quem for.
 
assentem a peida em frente aos ecrans , deixem de trabalhar com a seringa e depois venham- se queixar,que não sao valorizado qd são portadores de uma especialidade da tanga
 
Excelente!
 
De acordo anónimo das 7:44, mas há algo de maior relevância ...

Como tudo tem um preço neste sistema de mercado onde a lei do mais forte e da oferta e procura impera, será que a sociedade quer pagar muito ao que os enfermeiros fazem? E o que é que realmente fazem no seu dia-a-dia?

Há uma diferença enorme entre o que se diz que se faz, o que se faz e o que se espera que se faça ... confuso ...não muito se pensarmos um pouco!É que é aí que reside o cerne da questão ...

A sociedade em geral tá-se a borrifar para o preço do professor, do médico, etc ... mas se falta um professor na escola ou o médico no centro de saúde toda a minha gente se manifesta ... e lá anda o governo, atento, a tentar resolver a questão ...

Em relação ao enfermeiro que fica sozinho num serviço de medicina à noite ... alguém se importa verdadeiramente?

O valor social da profissão é muito mau ...

A produtividade também podia ser melhor ... não evoluimos na qualidade (na diferenciação do que temos para oferecer)...

Temos (a enfermagem) um mau ensino, uma organização super burocrática, afundamo-nos em papeis sem sentido e nulidades científicas, não conseguimos evoluir em termos de especialidades fruto de erros COLOSSAIS ... que se agravam com a actual carreira e péssima organização.

E em Portugal tivemos TODAS as condições de sucesso, de ocuparmos um lugar central: falta de médicos e outros técnicos de saúde, formação a nível superior (bacharelato, depois licenciatura, mestrados e mesmo doutoramentos), excepcionais condições de regulação da profissão com a criação da ordem dos enfermeiros ...

O que se fez? Nada. Até se regrediu.

A principal culpa é nossa, de todos. Mas principalmente de quem nos (des)orientou durante todo este tempo...

É aqui que está a principal falta de preço da nossa profissão!

Mas reafirmo tem toda a razão no que fala ...mas essa também não deveria ser uma preocupação dos nossos sindicalistas e da nossa ordem? É que há lá tanta gente!!!!
 
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